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Projeto de lei que busca proibir glorificação online de ataques em escolas trava no Senado

Projeto de lei que responsabiliza imprensa e Big Techs por veicular imagens de autores de ataques em escolas está parado no Senado há um ano; audiência pública, aprovada em mar.2023, ocorreu apenas após nova tragédia na Bahia.

Projeto de lei que busca proibir glorificação online de ataques em escolas trava no Senado

A discussão sobre o projeto de lei 2264/23, que visa criminalizar a glorificação de ataques em escolas online no Brasil, gerou tensões entre representantes do setor privado durante uma audiência pública na Comissão de Cidadania e Direito Digital (CCDD) do Senado, realizada na segunda-feira, 21.out.2024.

Críticas à proposta foram levantadas sobre possíveis ofensas à liberdade de imprensa.

O PL 2264/23 atualmente está na Comissão de Cidadania e Direito Digital (CCDD) há um ano, e o relator da proposição é o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente no governo Bolsonaro.

PL 2264/23. Com base no texto original, de autoria do senador Marcos do Val (PODEMOS-ES), a proposição propõe:

  1. Uma alteração no artigo 80 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para proibir os meios de comunicação de divulgar informações que identifiquem autores de ataques em escolas, conteúdos que revelem motivações ou detalhes da execução do crime - como manifestos e vídeos do ataque;
  2. Uma adição ao artigo 21 do Marco Civil da Internet (MCI) tornaria as redes sociais e plataformas obrigadas a adotar medidas para restringir a disseminação de conteúdos de glorificação dos ataques em escolas ou que identifiquem autores dos crimes, sendo consideradas 'responsáveis subsidiárias'.

AUDIÊNCIA. O requerimento para a realização da audiência pública foi aprovado pela CCDD em 6.mar.2024, mas a audiência ocorreu apenas meses depois, apenas uma semana após um novo ataque em Heliópolis, na Bahia, que deixou três adolescentes mortos.

Foram convidados representantes de grandes empresas de tecnologia, como Google e Meta, membros de grupos de lobby, como o Conselho Digital, autoridades da Polícia Federal e organizações sem fins lucrativos, como a SaferNet.

Todos os convidados para a audiência pública na CCDD

  • Samir Nobre: Diretor Executivo da Associação Brasileira de Rádio e Televisão - ABRATEL
  • Roberta Jacarandá: Diretora de Políticas Públicas do Conselho Digital
  • Valdemar Latance Neto: Coordenador-Geral de Combate a Fraudes Cibernéticas - CGCIBER/DCIBER
  • Gustavo Borges: Diretor do Laboratório de Direitos Humanos e Novas Tecnologias - LabSul
  • Alice Bernardo Voronoff: Consultora da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão - ABERT
  • Taís Niffinegger: Gerente de Bem-estar para América Latina - META
  • Juliana Cunha: Diretora da Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos - SAFERNET
  • Marcelo Lacerda: Diretor de Políticas Públicas - Google

CENSURA? Alice Bernardo Voronoff, consultora da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), expressou preocupação com as restrições que, segundo ela, "esbarram no sistema constitucional de proteção da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa".

Voronoff destacou que essas liberdades são essenciais "para um mercado livre de ideias", conforme o artigo 220 da Constituição. Ela alertou que o dispositivo proposto é amplo, abrangendo não apenas massacres, mas também crimes como roubos, estupros e agressões, cuja divulgação interessa à sociedade.

GOOGLE. O diretor de Políticas Públicas do Google, Marcelo Lacerda, declarou que, entre março e abril do ano passado, a empresa recebeu mais de 700 pedidos emergenciais "via Laboratório do Ministério da Justiça" relacionados ao terrorismo e ataques em escolas. Este ano, segundo ele, foram 90 solicitações.

"Por meio dessas requisições, nós [o Google] fornecemos dados que auxiliam na identificação e localização desses potenciais ofensores", disse.

Dados do MJ de out.2023, indicam que, entre abril e outubro, havia cerca de 900 solicitações de preservação ou remoção de conteúdos para várias empresas, não apenas o Google.

DERRUBOU NO YT… MAS SERÁ?
Devido à falta de contexto, o Diretor Executivo da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), Samir Nobre, alfinetou Lacerda, afirmando que a maioria dos resultados mencionados envolvia abuso sexual de menores.

"Fiz uma pesquisa rápida no meu celular e verifiquei que, ao buscar 'briga nas escolas' no YouTube, apareceram conteúdos como 'Briga em escola Stelio Machado', com 413 mil visualizações, postado há dois anos, e 'Briga das meninas na escola', com 900 mil visualizações, postado há um ano", disse.

O Núcleo checou e os vídeos permanecessem no ar após a audiência.

>>Vá até os 11 minutos da Nota taquigráfica, aqui.

Lacerda também informou que, entre janeiro e junho deste 2024, o Google removeu mais de 1,6 milhão de vídeos brasileiros que violaram as políticas do YouTube, embora ele não tenha detalhado quantos desses conteúdos estavam relacionados a violência escolar, extremismo ou terrorismo.

BIG TECHS. Representado por Roberta Jacarandá, head de Relações Institucionais, o Conselho Digital — que inclui como associados várias big techs, como o Google — defendeu penalidades para meios de comunicação que reportem ataques em escolas, mas se opôs à alteração no MCI que exige a remoção de conteúdos pelas plataformas.

Jacarandá apontou limitações relacionadas ao volume de conteúdo e aos sistemas de moderação, afirmando que 'a ausência de um sistema de notificação oficial, combinada com a falta de diretrizes claras sobre o que deve ser removido, dificulta uma ação rápida' para o que ela chamou de "remoção agressiva de conteúdo".

Organização oferece “lobby por assinatura” para Big Techs
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NO FINAL… Ao final da reunião, Mourão agradeceu aos participantes e pediu que as contribuições fossem enviadas ao gabinete para aprimorar o texto, propondo um substitutivo ao PL 2264/23.

"Nós temos muitos problemas de colocar algum tipo de legislação, e, quando chega a hora de colocá-la em execução, ela não tem condições de ser executada, seja pelo encarregado de fazer cumprir-se a lei, seja por quem tem que julgar, seja por quem tem que cumprir", disse.

Texto Sofia Schurig
Edição Sérgio Spagnuolo
Sofia Schurig

Sofia Schurig

Repórter com experiência na cobertura de direitos humanos, segurança de menores e extremismo online. Estudante da UFBA, começou como estagiária no Núcleo, passando a ser repórter em 2024.

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